Uma curta história do ceticismo até os tempos de Descartes
I – O ceticismo antigo e o Helenismo – Pirro
O ceticismo é um termo usado como um adjetivo para qualificar
a pessoa que duvida de tudo, ou um descrente com as coisas.
Entretanto, tomar essa noção como o sentido do ceticismo é
incorrer em erros interpretativos quanto à historicidade do
termo e do seu significado filosófico. O ceticismo é antes de
tudo uma importante doutrina filosófica, e não somente um adjetivo.
a pessoa que duvida de tudo, ou um descrente com as coisas.
Entretanto, tomar essa noção como o sentido do ceticismo é
incorrer em erros interpretativos quanto à historicidade do
termo e do seu significado filosófico. O ceticismo é antes de
tudo uma importante doutrina filosófica, e não somente um adjetivo.
O movimento cético se origina num período da história chamado
helenismo, mas suas raízes podem ser identificadas nos sofistas e
nos primeiros diálogos platônicos. O helenismo se origina com a
conquista de Alexandre, o Grande, das pólis grega e do império Persa.
No caminho de Alexandre para as Índias, estava o fundador do
ceticismo,Pirro de Élis (360 a.C. — 270 a.C). Em sua jornada pelo oriente,
Pirro, entra em contato com os gminosofistas, os sábios orientais e
faquiresascéticos, que pregavam a indiferença com o mundo,
principalmente no que tange a percepção sensível.
Essa ideia será um dos fundamentos essenciais do ceticismo antigo.
Essa indiferença com o mundo é conhecida como apathéia ou apatia.
helenismo, mas suas raízes podem ser identificadas nos sofistas e
nos primeiros diálogos platônicos. O helenismo se origina com a
conquista de Alexandre, o Grande, das pólis grega e do império Persa.
No caminho de Alexandre para as Índias, estava o fundador do
ceticismo,Pirro de Élis (360 a.C. — 270 a.C). Em sua jornada pelo oriente,
Pirro, entra em contato com os gminosofistas, os sábios orientais e
faquiresascéticos, que pregavam a indiferença com o mundo,
principalmente no que tange a percepção sensível.
Essa ideia será um dos fundamentos essenciais do ceticismo antigo.
Essa indiferença com o mundo é conhecida como apathéia ou apatia.
É pela indiferença que o sábio chega à epoché, a suspensão do juízo,
e, por conseguinte, por não se perturbar por querelas teóricas e por vagas
discussões, atinge a ausência das perturbações, ou seja, à tranquilidade
da alma, a ataraxia. Entretanto, diferentemente das filosofias helenísticas
contemporâneas do ceticismo, que julgavam que a verdade era alcançável
e necessária para viver uma boa vida, o ceticismo pirrônico aplicava essa
‘apatia’ ao nível teórico. Em outras palavras, o ceticismo de Pirro estende
a sua noção de indiferença com o mundo sensível ao nível teórico.
Ao desconsiderar todas as explicações teóricas sobre como a vida deve
ser vivida, o sábio cético suspende o juízo teórico, ou do que se pode dizer
sobre as coisas, e se preocupa em viver a vida comum. O sábio, então,
somente assente a sua afecção, ou das coisas que apreende pelos sentidos,
e vive a partir dela, e não vive com nenhum pressuposto teórico sobre a
vida, nem fica especulando sobre as coisas que vão além da percepção
dos sentidos, ou seja, pelo o que lhe parece.
e, por conseguinte, por não se perturbar por querelas teóricas e por vagas
discussões, atinge a ausência das perturbações, ou seja, à tranquilidade
da alma, a ataraxia. Entretanto, diferentemente das filosofias helenísticas
contemporâneas do ceticismo, que julgavam que a verdade era alcançável
e necessária para viver uma boa vida, o ceticismo pirrônico aplicava essa
‘apatia’ ao nível teórico. Em outras palavras, o ceticismo de Pirro estende
a sua noção de indiferença com o mundo sensível ao nível teórico.
Ao desconsiderar todas as explicações teóricas sobre como a vida deve
ser vivida, o sábio cético suspende o juízo teórico, ou do que se pode dizer
sobre as coisas, e se preocupa em viver a vida comum. O sábio, então,
somente assente a sua afecção, ou das coisas que apreende pelos sentidos,
e vive a partir dela, e não vive com nenhum pressuposto teórico sobre a
vida, nem fica especulando sobre as coisas que vão além da percepção
dos sentidos, ou seja, pelo o que lhe parece.
A noção da suspensão do juízo (epoché) é central e característica ao
ceticismo. Pois para chegar à suspensão do juízo é preciso opor o que
as doutrinas dogmáticas dizem sobre a vida. Para o cético, as doutrinas
dogmáticas possuem igual força de persuasão argumentativa. Ora,
o cético pirrônico considera que se toda a filosofia é discurso,
então todo discurso é persuasivo. Isso o leva a suspensão do juízo,
já que a verdade parece que não é possível de ser alcançada,
e em seguida, suspende o juízo, e, assim, chega à tranquilidade da alma.
ceticismo. Pois para chegar à suspensão do juízo é preciso opor o que
as doutrinas dogmáticas dizem sobre a vida. Para o cético, as doutrinas
dogmáticas possuem igual força de persuasão argumentativa. Ora,
o cético pirrônico considera que se toda a filosofia é discurso,
então todo discurso é persuasivo. Isso o leva a suspensão do juízo,
já que a verdade parece que não é possível de ser alcançada,
e em seguida, suspende o juízo, e, assim, chega à tranquilidade da alma.
A oposição não diz sobre negação ou afirmação de uma teoria, mas na
igualdade que diz respeito à credibilidade do discurso argumentativo ou
falta dele, de modo que nenhum dos pensamentos em conflito
argumentativo, por mais convincente que pareça, é superior.
A suspensão se trata de estagnação do pensamento,
que se deve de não se rejeitar nem afirmar, e quanto à tranquilidade,
é a ausência de perturbações, a quietude da alma.
Esse movimento do cético pirrônico de igualar as teses e os
argumentos persuasivos é conhecido como isosthenia.
igualdade que diz respeito à credibilidade do discurso argumentativo ou
falta dele, de modo que nenhum dos pensamentos em conflito
argumentativo, por mais convincente que pareça, é superior.
A suspensão se trata de estagnação do pensamento,
que se deve de não se rejeitar nem afirmar, e quanto à tranquilidade,
é a ausência de perturbações, a quietude da alma.
Esse movimento do cético pirrônico de igualar as teses e os
argumentos persuasivos é conhecido como isosthenia.
II – O ceticismo romano – Sexto Empírico e a Academia
Pirro, assim como Sócrates, não deixará nenhum material escrito para a
posterioridade. A maior parte dos seus ensinamentos são registros de sua
postura e dos ensinamentos aos discípulos, principalmente por seu pupilo,
Tímon de Fliunte (320 a.C. — 230 a.C). Com a morte do mestre, o ceticismo
se desenvolve, principalmente com o embate as filosofias dogmáticas, até
chegar a Academia de Platão. Figuras como Arcesilau (316 a.C – 241 a.C) e
Carnéades (214 a.C - 129 a.C), acadêmicos que em seus embates com o
estoicismo, fundaram os preceitos teóricos para as dúvidas céticas dos
sistemas filosóficos, e Enesidemo (150 a.C - 70 a.C), que retomou a noção
de epoché, do ceticismo pirrônico, para resolver problemas
epistemológicos¹ resultantes dos embates argumentativos.
posterioridade. A maior parte dos seus ensinamentos são registros de sua
postura e dos ensinamentos aos discípulos, principalmente por seu pupilo,
Tímon de Fliunte (320 a.C. — 230 a.C). Com a morte do mestre, o ceticismo
se desenvolve, principalmente com o embate as filosofias dogmáticas, até
chegar a Academia de Platão. Figuras como Arcesilau (316 a.C – 241 a.C) e
Carnéades (214 a.C - 129 a.C), acadêmicos que em seus embates com o
estoicismo, fundaram os preceitos teóricos para as dúvidas céticas dos
sistemas filosóficos, e Enesidemo (150 a.C - 70 a.C), que retomou a noção
de epoché, do ceticismo pirrônico, para resolver problemas
epistemológicos¹ resultantes dos embates argumentativos.
É importante notar que o ceticismo Acadêmico é diferente do ceticismo
Pirrônico. A diferença consiste, em termos simples, em que o ceticismo
Acadêmico recusa a possibilidade de existir qualquer conhecimento
verdadeiro sobre natureza. Enquanto que o ceticismo pirrônico,
ao contrapor tanto a filosofia dogmática com o ceticismo
Acadêmico chega à conclusão que não é possível ter um critério
suficiente para validar qualquer hipótese, já que ambas são totalmente
excludentes, e diante de tal impossibilidade de validar qualquer
conhecimento, suspende o juízo e atinge a tranquilidade da alma,
ou a imperturbabilidade.
Pirrônico. A diferença consiste, em termos simples, em que o ceticismo
Acadêmico recusa a possibilidade de existir qualquer conhecimento
verdadeiro sobre natureza. Enquanto que o ceticismo pirrônico,
ao contrapor tanto a filosofia dogmática com o ceticismo
Acadêmico chega à conclusão que não é possível ter um critério
suficiente para validar qualquer hipótese, já que ambas são totalmente
excludentes, e diante de tal impossibilidade de validar qualquer
conhecimento, suspende o juízo e atinge a tranquilidade da alma,
ou a imperturbabilidade.
O ceticismo pirrônico tem a sua máxima expressão com Sexto Empírico
(160 d.C - 210 d.C). O ceticismo de Sexto consiste em dividir as escolas
filosóficas em três: os Dogmáticos, que acreditam terem encontrado a
verdade; os Acadêmicos, que acreditam na impossibilidade de constituir
um conhecimento; e nos céticos, os que suspendem o juízo e continuam
investigando. Suas principais obras são as Hipotiposis Pirrônicas e os
Adversus Mathematicos. A primeira consiste nos seus comentários sobre
o ceticismo e os segundo, os seus embates contra as filosofias
dogmáticas.
(160 d.C - 210 d.C). O ceticismo de Sexto consiste em dividir as escolas
filosóficas em três: os Dogmáticos, que acreditam terem encontrado a
verdade; os Acadêmicos, que acreditam na impossibilidade de constituir
um conhecimento; e nos céticos, os que suspendem o juízo e continuam
investigando. Suas principais obras são as Hipotiposis Pirrônicas e os
Adversus Mathematicos. A primeira consiste nos seus comentários sobre
o ceticismo e os segundo, os seus embates contra as filosofias
dogmáticas.
Sexto Empírico, além de comentar as filosofias dogmáticas, também era
médico, e incluía, em sua prática, elementos da filosofia cética.
Sexto também foi um importante doxografo das filosofias romanas
e helenistas. A redescoberta de seus textos terão importantes
impactos no renascimento e no desenvolver
da filosofia moderna.
médico, e incluía, em sua prática, elementos da filosofia cética.
Sexto também foi um importante doxografo das filosofias romanas
e helenistas. A redescoberta de seus textos terão importantes
impactos no renascimento e no desenvolver
da filosofia moderna.
III – O ceticismo de Montaigne
No renascimento, a figura cética mais digna de nota será Michel de
Montaigne (1533 – 1592). Nos Ensaios, Montaigne retoma importantes
elementos do ceticismo pirrônico de Sexto Empírico. Além da dúvida,
Montaigne contrapõe as filosóficas dogmáticas e acaba chegando à
suspensão do juízo. E Montaigne, tal como Sexto, continua
investigando.
Montaigne (1533 – 1592). Nos Ensaios, Montaigne retoma importantes
elementos do ceticismo pirrônico de Sexto Empírico. Além da dúvida,
Montaigne contrapõe as filosóficas dogmáticas e acaba chegando à
suspensão do juízo. E Montaigne, tal como Sexto, continua
investigando.
A retomada do ceticismo de Montaigne terá impactos na filosofia
moderna. Ora, o ceticismo, com a suspensão do juízo oferece
uma impossibilidade à constituição de qualquer conhecimento verdadeiro.
Desta forma, o ceticismo se mostra como um obstáculo a ser
superado para fundar qualquer conhecimento verdadeiro.
moderna. Ora, o ceticismo, com a suspensão do juízo oferece
uma impossibilidade à constituição de qualquer conhecimento verdadeiro.
Desta forma, o ceticismo se mostra como um obstáculo a ser
superado para fundar qualquer conhecimento verdadeiro.
IV – O ceticismo como obstáculo ao conhecimento
O ceticismo, na filosofia moderna, se mostra como um
obstáculo ao conhecimento verdadeiro. Além de contrapor os
argumentos filosóficos, o ceticismo trás consigo uma
dúvida sistêmica. Essa dúvida se insere como uma forma a procurar
contradições no discurso dogmático. E como o discurso dogmático
se apresenta como possuidor da Verdade universal e do conhecimento
verdadeiro sobre o mundo, o ceticismo ao duvidar dos princípios da
teoria dogmática, estabelece um risco ao discurso dogmático.
obstáculo ao conhecimento verdadeiro. Além de contrapor os
argumentos filosóficos, o ceticismo trás consigo uma
dúvida sistêmica. Essa dúvida se insere como uma forma a procurar
contradições no discurso dogmático. E como o discurso dogmático
se apresenta como possuidor da Verdade universal e do conhecimento
verdadeiro sobre o mundo, o ceticismo ao duvidar dos princípios da
teoria dogmática, estabelece um risco ao discurso dogmático.
Portanto, o ceticismo, na filosofia moderna, se mostra como um
adversário a ser superado. O ceticismo vira uma caricatura, uma
simplificação, para que seja superado. Não é mais a postura de
suspensão do juízo ou da contraposição de dogmas, mas a postura
de sempre duvidar, de executar uma dúvida sistêmica em qualquer
forma de construir algum conhecimento verdadeiro.
Entretanto, o cético para de duvidar quando a duvida chega ao
plano da percepção sensível.
adversário a ser superado. O ceticismo vira uma caricatura, uma
simplificação, para que seja superado. Não é mais a postura de
suspensão do juízo ou da contraposição de dogmas, mas a postura
de sempre duvidar, de executar uma dúvida sistêmica em qualquer
forma de construir algum conhecimento verdadeiro.
Entretanto, o cético para de duvidar quando a duvida chega ao
plano da percepção sensível.
[1]
Ora, com a impossibilidade de constituir um sistema filosófico dogmático,
dada as dúvidascéticas dos sistemas, trás um problema de como conhecer
alguma coisa e se é possívelconhecer algo.
A suspensão do juízo retoma a importância de viver a vida
prática e quenão se é necessário um conhecimento especulativo para viver.
O que implica, entretanto,que o único conhecimento válido
é o conhecimento prático, tal como o da medicina e dasciências práticas.
dada as dúvidascéticas dos sistemas, trás um problema de como conhecer
alguma coisa e se é possívelconhecer algo.
A suspensão do juízo retoma a importância de viver a vida
prática e quenão se é necessário um conhecimento especulativo para viver.
O que implica, entretanto,que o único conhecimento válido
é o conhecimento prático, tal como o da medicina e dasciências práticas.
Bibliografia
Bett, Richard et
al, The Cambridge Companion to Ancient Scepticism, Cambridge
University Press, New York, NY, 2010.
University Press, New York, NY, 2010.
Porchat, Oswaldo, Rumo ao ceticismo, Editora UNESP, São Paulo, 2007.
Sexto Empírico, Hipotiposes Pirrônicas, Livro I, tradução de Danilo Marcondes.
Sharples, R.W, Stoics,
Epicureans and Sceptics, An introduction to Hellenistic
Philosophy, Routledge, New York, NY, 2002.
Philosophy, Routledge, New York, NY, 2002.
Wolter, Katarina Maurer, Um estudo sobre a relação entre
filosofia cética e
criação ensaística em Michel de Montaigne, Revista Dois pontos, Curitiba,
São Carlos, vol. 4, n. 2, p.159-170, outubro, 2007.
criação ensaística em Michel de Montaigne, Revista Dois pontos, Curitiba,
São Carlos, vol. 4, n. 2, p.159-170, outubro, 2007.
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